Coitada dela, se soubesse
A serenidade no olhar de quem estava abraçada ao canhão. (Foto: Meu arquivo pessoal) |
Vou pelo caminho prestando atenção na rua. No alaranjado do fim do pôr do sol com o azul escuro da noite. No cachorrinho que fuça o saco de lixo. Nos
prédios enormes. Nas pessoas voltando para casa e nas crianças sorridentes de mãos
dadas com os pais ao contar como foi o dia na escola. O carro para
e escuto uma conversa vinda da moto parada ao lado:
- Matemática é tão fácil. Não tem
mistério algum.
- Mas eu não gosto, tenho
dificuldade.
- Inglês que é mais difícil e tu
tira nota boa. Isso é falta de esforço, é só prestar atenção na aula.
- Eu presto! Mas odeio.
O semáforo abriu e eu sorri. Olhei
para o lado e meu pai comentou que a menina parecia comigo. É, na minha época
de fundamental (principalmente no oitavo/nono ano), preferia quatro aulas seguidas de inglês a ter duas seguidas de
matemática.
Meu pai sempre havia sido muito bom na matéria e vivia reclamando da
minha pouca desenvoltura com números. E para tentar me fazer criar gosto, passava
algumas tardes, na minha lousa, me ensinando. A mesma que eu o fiz comprar
quando ainda estávamos em Brasília, pois não queria brinquedo, queria um quadro de giz para enfileirar
minhas bonecas, minha mãe inclusa, e ensinar o que tinha aprendido
na escola.
Não preciso dizer que as tardes
de matemática não impediram que eu continuasse ruim na disciplina. Aliás,
frequentei muitas recuperações por causa dela. A única matéria do Ensino
Fundamental que me fazia perder bons dias das minhas férias de final de ano e escutar
meu pai dizer a mesma coisa a cada ano que passava: "matemática é tão fácil, é só prestar atenção na
aula e se esforçar". O mesmo argumento e o mesmo tom que o pai da garotinha usou
com ela.
Bateu a saudade. Me lembrei que tudo
o que eu queria quando menorzinha era crescer e deixar de ir para a escola. Cresci mais um pouco e a raiva pela matemática surgiu, eu queria era nunca mais ver uma fração e mais tarde, veio a trigonometria. Me perguntava onde estava a universidade. Crescer era isso então? A danada ia ficando mais difícil? Coitada da mini-Marcelha,
se soubesse que a matemática continuaria tirando sua paciência, mas seria o menor dos seus problemas...
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